sexta-feira, 20 de agosto de 2010

o' clock


Já passava da meia-noite quando meus ouvidos foram incomodados por pequenos barulhos vindo da porta. Receosa de quem poderia estar chegando, prostei-me imóvel na cadeira e fiquei a observar. Devido a penumbra provocada pelas venezianas da janela, vi a porta abrir-se e com toda a delicadeza daquela madrugada, uma mulher grávida de aparência bastante atraente entrou sem ao menos pedir licença.
Ela tremia incessavelmente e entre soluços levava suas mãos até a barriga e murmurava súplicas de perdão a todo instante. Não desejava despedir-se daquela futura criança de forma tão brutal, não queria matá-la antes mesmo dela ter nascido. Eram quase sete meses de convivência diária: na hora do jantar, nos passeios ou até mesmo no banho; os dois estavam sempre juntos, literalmente; mas por algum motivo não-aparente ela iria fazer isso, ela tinha que fazer isso.
Vi-a tomar alguns comprimidos para iniciar seu aborto, pensei que ela fosse desmaiar por estar tão fora de si. Observei a tudo aquilo atônita, sem forças para manifestar-me ou ao menos tentar entender o motivo de tudo isso.
Deparei-me com a mulher contorcendo-se de forma involuntária e incontrolável, presumi que seu corpo já estava expulsando o feto totalmente sem vida. Eu não aguentaria ver tal cena, olhei para o relógio, já passava da meia-noite e meia, então desliguei a tv e fui dormir.

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